A
LIÇÃO
As sandálias do
discípulo ressoavam surdamente
nos
degraus de pedra que levavam aos
porões
do velho mosteiro.
Empurrou a
pesada porta de madeira que cerrava
os
aposentos do ancião e custou a localizá-lo na
densa penumbra,
o rosto velado
por um capuz,
sentado atrás de
enorme escrivaninha onde, apesar
do
escuro, fazia anotações num grande
livro,
tão velho quanto ele.
E o discípulo o
inquiriu:
- Mestre, qual o
sentido da vida?
O idoso
monge, permanecendo em silêncio, apenas
apontou um
pedaço de pano, um trapo
grosseiro
no chão junto à parede e logo após, seu
indicador
ossudo e encarquilhado mostrou logo
acima, no
alto do aposento o vidro da
janela, opaco sob
décadas de poeira
e teias de
aranha.
O discípulo pegou
o pano e subindo em algumas
prateleiras de uma pesada estante forrada de
livros
conseguiu alcançar a vidraça, começando
então a esfregá-la com vigor, retirando
a
sujeira que impedia sua
transparência.
O sol inundou o
aposento, banhando com sua
luz
estranhos objetos,
instrumentos raros e dezenas de
papiros e pergaminhos com
misteriosas anotações
e signos
cabalísticos.
O discípulo, sem
caber em si de contentamento,
a
fisionomia denotando o brilho da
satisfação
declarou:
- Entendi,
mestre.
Devemos nos
livrar de tudo que obstrue nosso
aprendizado; buscar retirar o pó dos preconceitos
e
as teias das opiniões que impedem que a
luz do
conhecimento nos atinja e só
então poderemos
enxergar
as coisas
com mais nitidez, partindo
então para
a evolução.
E assim, o jovem
discípulo fez uma reverência
deixou
o aposento, agora iluminado,
a fim de
dividir com os outros a lição
recém aprendida.
O velho monge, o
rosto enrugado ainda encoberto
pelo
largo capuz, os raios do sol da manhã
agora
banhando-o com uma claridade a que
se
desacostumara, viu o discípulo
se afastando e
deixou escapar um tênue
sorriso.
- Mais importante
do que aquilo que alguém
mostra
é o
que o outro enxerga...
pensou ele. E
murmurando baixinho:
- Eu só
queria que ele colocasse o
pano no
lugar de onde caiu.
(desconheço
o autor)
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